terça-feira, 30 de agosto de 2016

Reflexão # 72 - Expor-se a uma Tradição de Ensinamento

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Todos nós carregamos uma ferida existencial e sem ela seria inexistente qualquer forma de impulso e irrelevantes as palavras como amor, compaixão, felicidade, libertação, realização, autoconhecimento. O que nos move numa busca é a espécie de inquietação que habita os recônditos dum coração sem forma, espaço ou tempo, que conduz corpo e mente num processo de maturidade, reconhecimento da realidade que sou. Como se caminhassem no meio de um nevoeiro cerrado que lhes impede uma visão mais ampla de si mesmos, impulsionando-os naturalmente a caminhar, querer sair daquela névoa e finalmente encontrar a visão que lhes traz relaxamento, paz, contentamento e aquele “descanso do guerreiro” que cessou a sua luta e busca, abrindo os seus braços para a vida e para a morte.
Este processo é longo e recheado de intempéries, bonança que jamais poderão nos desviar do propósito do caminho, dos passos e do “descanso do guerreiro”. Naturalmente vamos desesperar nas tempestades, sentir dor, desconforto e desejar sair debaixo dela, lutando, fugindo, procurando sobreviver, adiando o contacto com o fenómeno, de peito aberto, destemido, confiante, que me revelará a sua mutabilidade, relatividade, inteligência e propósito maior. Da mesma forma posso distrair-me na bonança, aliviar, compensar carências, fragilidades, alimentar as minhas fantasias e passar o verão a cantar como a cigarra, que se esquece que o Inverno está à porta e se não trabalhar vai morrer de fome…

Quando decidimos expor-nos a um método, a uma tradição milenar estamos a receber uma bênção dos deuses, uma oportunidade de ser o menino que caminha por entre nevoeiro, tempestades, bonança, de mãos dadas com o pai e a mãe, até as suas pernas deixarem de tremer e ficarem fortes, firmes para seguir em frente. A tradição é esse pai e mãe que guiam o seu filho, ensinando-o a ter as rédeas da sua vida, escolhas, decisões, resgatando, alimentando a sua integridade, dignidade. É o pai e a mãe que nutre, ampara no seu amadurecer e que pouco a pouco vai largando a mão do seu menino para que ele caminhe por si só, inteiro, confiante, pleno e feliz.
Nesse processo muitas serão as emoções, sensações. A tradição vem pelas palavras, acções de pessoas, seres que abençoadamente recebem esse papel e que amorosamente dão o seu melhor a desempenhá-lo. Por vezes vamos amá-los, outras odiá-los. Vamos sentir alegria, tristeza, raiva, revolta, medo, ciúme, inveja, amor, compaixão. Vamos iludir-se e desiludir-se. Vamos apaixonar-se e desapaixonar-se. Vamos querer parar, depois terminar, mais tarde continuar e aprender a segurar. O “bicho vai pegar”, a catarse operar mas ainda assim se vai querer ficar, porque é o pai e a mãe que estão a falar, é o pai e a mãe que estão a contar e com todo o seu amor a ensinar…
De toda esta trama, cenário, drama, história, ficará de herança o conhecimento de uma cultura, histórias épicas, rituais, língua, poesias sagradas, mas acima de tudo um individuo que ao entrar em contacto com os arquétipos que carrega dentro de si, consegue ser mestre ao relacionar-se com cada um deles. Um individuo que aprende a ser pai e mãe de si mesmo, descobrindo o infinito amor que o permite.
Que possamos seguir em frente passando adiante tamanha beleza e proeza.
O meu namaskar aos mestres e professores que decidem fazer das suas vidas a representação de um papel tão intimo, puro, inocente e profundo.
Bem hajam.
HarihOm
Sónia A.
  

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Reflexão # 71 - A Dor Cega...

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Cegos de dor, sofrimento, inconscientes de velhos, repetitivos e devoradores padrões mentais, viciados nas garras e delícias do ego, elevaremos as nossas vozes para falar de Deus, Amor como algo que se coloca numa prateleira e se elege, se escolhe, domina, apodera, saciando aparentemente um desejo que na verdade esconde por detrás de si, o verdadeiro e profundo, insaciado pela realização infinita de qualquer um, o desejo por libertação, felicidade eterna.
Por conta dessa ignorância, carregamos às nossas costas o mundo, as pessoas, as relações. Vitimizamo-nos, culpabilizamo-nos, escandalizamo-nos, embrutecemo-nos, pregando a Deus sem o menor senso de verdade, autenticidade, espontaneidade e pureza. Como pode? Como vivemos uma contradição tão gigante que nos afasta, ainda que aparentemente unidos!
Que se faça silêncio.
Que nos afastemos mais para perceber o que nos une.
Que possamos ousar ver a sujeira, poeira que carregamos no coração! Só assim poderei entender que pureza, inocência, amor é a sua condição.
Que possamos escutar com coragem, força e firmeza as vozes perversas, ardilosas, fantasiosas que nos habitam. Não as julguemos de boas ou más. Não as tomemos como verdade absoluta mas como ferramentas que nos conduzem ao encontro real consigo mesmo. Que se enfrente o monstro que nos habita e que se lhe dê um forte e amoroso abraço. Sentemo-nos para conversar. O monstro é uma mera criação que posso desconstruir e transformar.
Que nossas mentes possam ganhar lucidez, capacidade de discernir e os nossos corações destemor, para escutar e sentir.
Desaprendemos tal habilidade, faculdade, dom e talento divino e talvez por isso caímos tão facilmente em armadilhas linguísticas que nos apanham na esquina das nossas emoções, como “os meus amigos de verdade, quem me ama de verdade, quem me valoriza, quem me respeita, quem me, quem me…”. Talvez porque pareça mais fácil, cómodo, confortável. Talvez porque nos alivie e desresponsabilize das nossas ações, decisões. Talvez porque aprove a miséria onde nos encontramos e não queremos sair por medo, desespero ou covardia.
Como podemos credibilizar tal conversa que apenas nutre o nosso senso de carência, dependência, julgamento e separação?
Possamos ficar espertos e despertos...
Possa a nossa dor ser lúcida ao invés de cega...

HarihOm
Sónia A.

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Pensamentos Soltos # 76

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Nós somos como aranhas que montam a sua própria teia. Tudo o que nos causa sofrimento é um fio criado que se foi entrelaçando a outro e mais outro, tecendo complexas estruturas que nos trazem senso de proteção e sobrevivência. Quando ousamos investigar a verdade por detrás da teia e todos os tecidos, observaremos o caos montado pelas próprias mãos… ignorância, ingenuidade, crença numa completa loucura desprovida de lógica, verdade, pureza e firmes alicerces. Nenhuma teia, estrutura, fios tecidos estrategicamente, resistem ao primeiro sopro de verdade e força da natureza… tudo questão de tempo para se desmoronar tal qual um castelo de areia…
Verdade é como um furacão, uma força da natureza que passa deixando uma aparente destruição… Mas o que de facto é destruído senão paredes, muros, falsos castelos de dominadores e dominados, de controladores e controlados, de submissos, resignados, de dependentes e independentes, de fortes e fracos, de escravos, reis, rainhas, príncipes e princesas, banquetes, glamour, pobreza, miséria…
Abençoado furacão que dá lugar à renovação…
HarihOm
Sónia A. 

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Reflexão # 70 - Para onde Vou? ...

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Nascemos puro e inocente amor, dotados da capacidade inata em confiar, entregar-se ao fluxo natural da vida… o mundo que se apresenta externamente, um permanente convite a descobrir-se enquanto ser humano… a interação com o meio envolvente a ferramenta que me conduz ao real propósito de estar aqui numa verdadeira epopeia existencial, sofrendo, ignorando, buscando libertação, desejando felicidade eterna, paz inabalável, que só voltando a reconhecer a inteligência perfeita que me permitiu vir ao mundo, aberto, disponível, puro, inocente, naturalmente amoroso, dotado da capacidade de reconhecer a natureza básica e fundamental que dita os contornos da minha história.
Procurar alimentar-se, nutrir-se do mundo, esperando dele conforto, carinho, reconhecimento, festinhas e coceguinhas na barriga, que consolam, compensam momentaneamente uma dor, é uma sentença de morte ainda que vivo. O mundo que se apresenta externo a mim é um mero reflexo, um espelho que posso usar e abusar para me ver mas que em algum momento vai tornar-se insuficiente para responder à busca mais sincera, profunda e verdadeira que habita os recônditos do coração. Mirar-se, adornar-se diante do espelho vai tornar-se escasso. Os fenómenos da humanidade em mim são infinitos, poderia sentar-me por toda a eternidade só a contemplar, apreciar, rejubilar, dramatizar, sofrer, ignorar, assim este corpo e mente fossem de natureza eterna… Mas, não é o caso. Tem prazo de validade, graças a Deus.
Então, algo precisa ser reconhecido, revelado, escutado… quem pede é um coração inquieto, insatisfeito, sedento de algo que não tem nome ou palavras e que se manifesta no cansaço, no desespero, na insaciabilidade do mundo, pessoas, relações. Algo que os olhos não vêm, os ouvidos não escutam, a boca não fala mas presente, auto-evidente.
Desejarei sentar com a pureza, inocência, confiança de uma criança que não julgando a sua ignorância, dá a mão para que lhe seja apresentada tal realidade.

E assim vai…  

HarihOm
Sónia A.

Pensamentos Soltos # 75

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Quando o mar está agitado e te vez emaranhado no turbilhão da onda que rebenta, sem ver, aflito para respirar e desejoso de sair dali, mais do que saber nadar é importante a atitude de saber esperar, confiar, entregar…
Se decidir espernear, lutar desesperadamente contra a sua força e processo natural de rebentação, morrerei na praia…
A sua natureza é tão inteligente e sofisticada que não há corpo ou mente que a alcance… assim como a natureza das nossas emoções e pensamentos…
O que me traz calma, clareza, discernimento, força interna é o reconhecimento firme dessa realidade fundamental e essencial…
Por medo, posso nunca querer saber como é maravilhoso dar um mergulho no mar…
Por precaução, posso nunca me emaranhar na rebentação de uma onda…
No entanto, sempre estarei sentado na areia da praia a contemplar a sua imensidão sem me relacionar, experienciar e profundamente a desejar. 
E ainda que este corpo e mente aparentemente se mostrem vivos, de verdade estão mortos... a vida que tanto quero preservar é uma miragem da vida que efectivamente gostaria de viver, conhecer e sentir. 
Portanto, mortos por mortos que se aprenda a nadar, se ouse mergulhar e se preciso nas ondas do mar rebolar... 
É para isso que aqui estamos! 
HarihOm

Sónia A.



sábado, 13 de agosto de 2016

Reflexão # 69 - Mamã não quero conversa... só o teu silêncio...


Quando é oferecido a uma criança espaço para ela se revelar, ser, algo muito belo podemos apreciar… a inocência, espontaneidade, pureza, amor e sabedoria na hora de relacionar-se com a ignorância que carrega.
Inteligentemente não a julgará de boa ou má, tampouco quererá removê-la… abalada por um sentimento doloroso apenas desejará vivê-lo exatamente como se apresenta, expressando-o da forma que o seu corpo pede, procurando mecanismos de amparo, nutrição que lhe permite sobreviver…
Pude perceber tal fenómeno quando a minha filha me pediu colo, silêncio, abraço, presença no seu esconderijo secreto, quando experienciava a dor de a sua amiguinha ter indo embora...
Montou o drama, chorou, gritou, esperneou e rejeitou qualquer conversa que justificasse a sua dor… toda a vez que abria a boca ela dizia “ Mamã não quero ouvir nada…só quero ficar contigo em silêncio”…
Foi uma lição para mim e um objecto de reflexão…
Quantas vezes nos colocamos diante da dor dos outros com essa postura de grande conhecedor, querendo transmitir a todo custo fórmulas, métodos, caminhos sem tampouco dar-lhes tempo e espaço para ser aquela criança que deseja viver a sua dor, ignorância pedindo apenas presença, amparo e nutrição?
Sem dar conta apenas estamos a retirar o poder pessoal de cada um, a contribuir para negligenciar a força interior que carrega e para escamotear o como ela anda de mãos dadas com a capacidade de expor vulnerabilidades e fragilidades.
Na verdade, quando nos posicionamos dessa forma, conhecedores de grandes teorias, charadas, orgulhosamente detentores de fórmulas que curam feridas, apenas estamos a enganar-nos mais um pouco e a ignorar a incapacidade de ficar frente a frente com as suas próprias dores, que a bem da verdade não são assim tão diferentes das dos outros, tampouco das crianças.
O que acontece é que somos crianças crescidas que aprenderam a mascarar as suas dores, agonias e a fazer delas objecto de orgulho, arrogância, prepotência, vitimização e tudo mais.
Talvez tenhamos de nos dar oportunidade de caminhar em direcção a essa criança esquecida, perdida e dar-lhe oportunidade de viver todas as suas dores, exactamente como se apresentam… sem julgar de bom ou mau, certo ou errado e aprender a ser a mãe que senta com toda a sua presença e fica silenciosamente amparando, nutrindo.
Sónia A.

HarihOm